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20 de Maio de 2024
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    Horst Volk: "Empresário não deve ser político"

    Natural de Campo Bom (RS), Horst Ernest Volk notabilizou-se como empresário do ramo calçadista, setor que buscou representar quando eleito pelo então Partido Democrático Social (PDS) para uma cadeira no Parlamento gaúcho em 1982, onde permaneceu por uma legislatura. Casado e pai de quatro filhos, desde a infância Volk teve a sua vida ligada ao ramo calçadista. Seu pai era empregado de uma indústria de calçados em Campo Bom e, em seguida a família se transferiu para Sapiranga (RS), onde seu pai passou a ser empresário calçadista. Em Sapiranga a família permaneceu por quatro anos, transferindo-se para a cidade de Gramado no ano de 1952. Na cidade, a família abriu a Ortopé, que se transformaria na maior fábrica de calçados das Américas. Volk foi vereador, prefeito (interventor) de Gramado, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados e criador do Festival de Cinema de Gramado.

    Agência de Notícias - Quais foram os motivos que o levaram a ingressar na política ?

    Horst Volk - A gente começa brincando de política, porque eu fui um empresário conhecido, tinha muitos empregados, até que as lideranças da cidade me convidaram para ser vereador. Eu nem de longe pensei um dia em entrar para a política, mas aí veio a pressão e, aquela velha história, é procurado quem a comunidade quer, quem a comunidade precisa e pode eleger. E em 1963 eu fui eleito vereador em Gramado como o terceiro mais votado, para minha surpresa, pois não sabia que ia ser assim. Fui reeleito em 1968, tendo sido o mais votado do meu partido e assumi nesta legislatura muito pouco tempo, pois o então prefeito de Gamado foi cassado. Com a cassação, fui convidado a ser interventor federal. A gente fala "fui prefeito", mas na verdade eu fui interventor federal. Eu não fui eleito prefeito, mas substituí por quase todo o tempo de mandato do prefeito que havia sido eleito e que havia sido cassado, pois ele ficou por apenas três meses no cargo e eu fiquei quase quatro anos na prefeitura.

    Agência de Notícias - Como foi a sua primeira experiência no Executivo?

    Horst Volk - Fiz uma administração que todos acham que foi muito boa, porque sempre queriam que eu fosse candidato a prefeito de novo. Mais tarde a política me levou para uma escala mais alta, pois terminei sendo não apenas empresário em Gramado, mas também fiz a política empresarial.

    Agência de Notícias - A que se deve a sua ligação com o Turismo ?

    Horst Volk - Fui prefeito numa área turística, e mentor e fundador da Associação de Municípios de Turismo Serra e Mar, onde exerci uma liderança do setor turístico da região. Foi quando fui convidado para ser deputado.

    Agência de Notícias - Como se deu a sua eleição ao Parlamento gaúcho, e por que o senhor não conseguiu se reeleger?

    Horst Volk - Fui candidato e me elegi em 1982. Estive nesta Casa de 1983 a 1986. Tentei a reeleição, mas não fui eleito porque naquele ano foi lançado o Plano Cruzado, que foi determinante para o PMDB, MDB na época, que elegeu todos os governadores e não sei quantos deputados. O PDS tinha 23 deputados naquela legislatura e na eleição seguinte ficou reduzido para oito. Entrou aquela história de que nós éramos o partido dos militares, e havia uma campanha muito forte contra nós, partido dos militares e, terminamos não elegendo muitas pessoas, quando eu também não me reelegi. Mas também não me fez mal pois eu tive que voltar para a empresa, e porque empresário não deve ser político. Isto é um exemplo que quero dar para muitas pessoas que encontro. Se alguém quer ser um bom empresário, se quiser crescer como empresário, não deve ser político.

    Agência de Notícias - Como era ser político no início da redemocratização do país?

    Horst Volk - Os políticos, em Brasília dizem que a década de 80 foi uma década perdida. Eu acho que a transição dos militares para os civis criou um ambiente de muita euforia, e aí se confundiu um pouco democracia com anarquia. Mas isto acontece não só no Brasil, mas em muitos lugares. É o que se vê hoje na Rússia: o comunismo dominou por muito tempo, fechadíssimo, e agora se houve falar da anarquia, da máfia. Voltando a falar no Brasil, foi uma época de transição necessária, e diga-se de passagem que foi uma transição inteligente, iniciada com o general Ernesto Geisel, que defendeu a passagem do poder aos civis de forma legal. Quando ele nomeou presidente o general João Batista Figueiredo, foi para que se fizesse a abertura democrática, e assim foi feito. Depois disto teve-se aí um lance de pouca sorte, eu diria, porque foi eleito Tancredo Neves, que seria com certeza um bom presidente, em função de sua trajetória de quase 50 anos de vida política. Com a morte prematura de Tancredo, José Sarney assumiu a presidência. E durante o mandato do Sarney houve uma escalada inflacionária impressionante, um governo que pessoalmente acho que foi desastroso.

    Agência de Notícias - Qual era a sua plataforma política como deputado?

    Horst Volk - Eu fui, na verdade, um legítimo representante de um setor de grande importância para o Rio Grande do Sul, que foi na época o primeiro exportador. O setor calçadista era a atividade industrial que mais empregava, mais que a construção civil. Eu realmente falava muito pouco, e quando isto acontecia, eu falava sobre o setor de calçados ou do turismo. Como prefeito de Gramado eu criei boas relações com o setor turístico, que me elegeu junto com a área calçadista, e assim eu representava muito bem estes dois segmentos

    Agência de Notícias - Quais foram os projetos de sua iniciativa na Assembléia?

    Horst Volk - O meu único projeto apresentado e aprovado, quando fui deputado, foi o da criação da delegacia da mulher, pioneiro no Rio Grande do Sul. Isso me deixou muito feliz, pois havia uma real necessidade. A primeira delegacia foi ali na Rua da Praia, perto da Praça Dom Feliciano. Foi uma idéia muito importante, pois a mulher teve onde dar queixas sem constragimentos. O projeto surgiu do apelo de associações femininas. Acredito que entre o casal deve existir harmonia, para que os filhos tenham o exemplo. Se o filho vê que os pais brigam, acaba achando que o mundo lá fora é assim, e passa a ser violento na escola e na vida.

    Agência de Notícias - Como surgiu a oportunidade de assumir uma Secretaria de Estado no primeiro ano do seu mandato parlamentar?

    Horst Volk - Eu estava ligado à área de turismo, embora eu quisesse ser deputado, em seguida o governador Jair Soares me convidou para ser secretário de Turismo do Estado. Foi nesta época que foi criada a Secretaria de Turismo, que até então se denominava Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte. Eu fiquei só com a Secretaria de Turismo, que durou um ano e pouco, pois foi desativada pelo governador. Com isso eu não fui um bom parlamentar. Eu comecei errado, mas eu queria realmente representar a minha região e fazer aquilo que havia feito em Gramado, transformar o Rio Grande do Sul num Estado turístico. Eu sou mais executivo. Talvez eu seja um dos poucos deputados que fala que não fui um bom deputado. Você não ouve um deputado falar, olha eu não sou um bom deputado ou eu não sou um bom deputado, mas eu digo que não fui um bom deputado.

    Agência de Notícias - Por que o senhor diz isso?

    Horst Volk - Além de ter uma tendência de ser mais executivo, eu ainda tinha a representação de segmentos empresariais, hotéis, agência de viagens e depois a indústria de calçados. Isso me empurrou para um outro lado, e daí ainda fui prejudicado por ter ficado mais de um ano na Secretaria de Turismo. Quando eu cheguei no segundo ano legislativo na Assembléia, fiquei quase como o último da fila para entrar numa sequência de lideranças, pois as pessoas que vão se firmando no primeiro ano vão sendo escolhidas, quem vai ser o líder, quem vai ser o presidente, quem vai fazer parte da Mesa Diretora, quem vai ser presidente de comissão. O segundo ano já havia sido negociado, estava tudo pronto e eu só podia pensar no terceiro e quarto anos, o que me prejudicou.

    Agência de Notícias - E foi possível participar mais da atividade parlamentar nesses anos?

    Horst Volk - No quarto ano eu fui presidente da Comissão de Finanças e Orçamento, onde me saí muito bem. Na época os projetos não andavam e, nos últimos 30 dias, eram aprovados sem se discutir muito, tudo porque faltavam cinco dias para o recesso parlamentar. Quando presidi a comissão, procurei aprontar os projetos o mais cedo possível, colocar em votação no plenário. Isto era feito para que não houvesse acúmulo de projetos no último mês do ano legislativo, o que era comum. Eu fiz isto dentro de um espírito empresarial. Eu não fui um bom tribuno, não sei dar um bom discurso e isso me tirou um pouco da liderança.

    Agência de Notícias - Que parlamentar se destacava quando usava a tribuna?

    Horst Volk - Já faz muito tempo para a gente poder lembrar os detalhes, mas creio que o melhor tribuno na época, do nosso partido, foi o Jarbas Lima. O Jarbas Lima era um tribuno com discurso inflamado, que realmente mexe com os nervos de uma pessoa se quiser dar um discurso agressivo, com mais profundidade. Ele era realmente o melhor tribuno. O Cardona (Roberto Atayde Cardona) era o nosso líder e que aparava as arestas, trazia os projetos mais ou menos discutidos com a oposição. Teria muitos nomes a lembrar, o coronel Pedro Américo Leal, um bom companheiro, a deputada Dercy Furtado também uma boa companheira, e tantos outros.

    Agência de Notícias - Que tema (s) dominava (m) as discussões na Assembléia?

    Horst Volk - Não havia grande polêmica na época, não. É claro, existiam as discordâncias rotineiras, até porque na época era ainda o PMDB o partido de esquerda, centro-esquerda, melhor dito. Não existia ainda o PT na época. A primeira bancada do PT na Casa foi eleita justamente quando eu saí, na eleição de 1986. Havia realmente dois partidos na época, Arena (PDS) e MDB (PMDB). Eu sempre achei muito harmonioso. Foi na época em que houve a transição política, o que talvez tenha colaborado.

    Agência de Notícias - O que significou a sua passagem pelo Parlamento?

    Horst Volk - Não me deixou muita saudade. Como eu já falei que não fui bom deputado, o que deixou saudades foram as pessoas que trabalham aqui. Hoje eu fui abraçados por algumas pessoas que conheci naquela época, o que me deixou muito feliz. Eu nunca mais queria ouvir falar em política, nunca mais aceitei ser deputado. Fui até convidado para concorrer a deputado federal. Eu fui presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados e portanto tinha muita influência no setor e poderia ser representante na Câmara Federal. Me deu muito prejuízo ser deputado estadual.

    Agência de Notícias - Qual a diferença de fazer política naquela época, anos 80, e hoje?

    Horst Volk - Eu acho que na época não se falava em corrupção como se fala hoje. É impressionante o que se lê e ouve. Acho que deveríamos ter menos partidos políticos e que as leis deveriam ser mais rígidas para novos partidos. Sou francamente favorável à fidelidade partidária, e acho que o Judiciário agiu em bom tempo sobre isto. Para mim, partido pequeno é partido de aluguel. O mensalão abriu uma janela, vitrine de corrupção sem precedentes na história do Brasil, e não se pode acreditar que ninguém tenha sido punido até agora. Casualmente, aquele que falou sobre a corrupção e o mensalão é que foi cassado, o que me parece estranho. E o nepotismo é uma prática que precisa acabar.

    Agência de Notícias - O que o senhor faz hoje?

    Horst Volk - Hoje eu sou aposentado, não tenho mais a minha empresa, onde trabalhei como presidente durante 45 anos e depois deixei para os meus filhos, que a venderam. Trabalho na área da Cultura, sou secretário-executivo da Associação de Cultura e Turismo de Gramado, onde faço projetos, controlo orçamentos e contratos, faço o pagamento dos eventos. Gramado é a cidade que mais eventos realiza no Rio Grande do Sul. Temos 12 eventos hoje em Gramado, e precisamos movimentar a cidade durante o ano todo, e para isso tem que ter uma sociedade mantenedora. Aposentado, pensando que a vida já ia terminando por aí mesmo, incomodando a mulher na cozinha, me convidaram, aceitei, e com os meus 75 anos voltei a trabalhar. É realmente honroso para mim trabalhar com Cultura. É uma coisa bonita, pois eu trabalhei 50 anos pensando em dinheiro, aquela história de ter uma empresa e sempre com aquela vocação de ganhar mais, ser o maior e o melhor. Esta é uma vocação que ficou de lado, porque na vida, na verdade nós temos duas coisas: uma é correr atrás do dinheiro, mas também tem o lado de que a gente quer viver bem, em harmonia com a família e com a sociedade. Durante muito tempo em Gramado eu fui o porto seguro de muitas pessoas, e gostaria de voltar a ser isto para a Cultura. Por isso voltei a trabalhar aos 75 anos.

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