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18 de Abril de 2024
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    Do capitalismo neoliberal ao capitalismo de Estado

    O desfechar do século XX e o descortinar do novo milênio pareciam significar a consolidação da mais absoluta supremacia da idéia de que o estado mínimo fechava um ciclo histórico, amplamente virtuoso e por decorrência vitorioso. E com ele se consagrava uma grande definitiva sobreposição do liberalismo àqueles que ainda compreendiam a necessidade de um papel estruturante para as funções públicas do Estado moderno.

    Não completaram- se 20 anos do fracasso do socialismo, cuja maior expressão foi a queda do muro de Berlim, comemorada sobre seus escombros e ruínas pelos arautos do fim das ideologias ou mesmo do fim da história, o que vemos agora é uma crise brutal e sem precedentes, que afeta o núcleo do capitalismo neoliberal, qual seja, o modelo de acumulação baseado na hegemonia financeira. Açambarcando as finanças mundiais, com profundas repercussões sobre o complexo sistema bancário internacional e, por consequência, sobre o crédito e a produção, levando grandes conglomerados americanos e europeus à falência.

    O grande símbolo contraditório deste momento é o apelo unânime à intervenção do Estado, para assumir funções até então tidas como ineficientes e danosas à livre iniciativa. A iniciativa pública agora passa a ser a grande "mão visível" para regulação dos mercados, cujo conceito impulsionador e estruturador traz, embutido em si, uma lógica de incapacidade de autocontrole e de autoregular-se.

    Avaliadas, de forma criteriosa e desapaixonada, as dimensões de cada um destes momentos históricos, seja o da queda do muro em 89, seja o do colapso do muro nova-iorquino que se espalha agora em escala mundial, nos obrigam a reflexões e algumas conclusões evidentes.

    O primeiro, à época, expôs os limites do socialismo real e as insuficiências de um modelo em que a questão democrática não ocupava um lugar universal.

    O segundo, na atualidade, mostra que a pretensa racionalidade econômica que a globalização nos legou, de que era necessário libertar as forças criativas do mercado como forma de desvencilhar-se da intervenção e do dirigismo, são reveladoras de que o neoliberalismo, capitalismo desregulado, está sendo levado a sucumbir, mergulhando numa acelerada e profunda crise.

    Tal crise pode ser abordada de vários ângulos. Porém aqui falo de uma, que julgo fundamental: a perda da capacidade crítica que foi dominante na quadra histórica que vivemos. Como em outros períodos da humanidade, o modelo neoliberal sempre se colocou acima do caráter crítico do seu tempo. E em cada época isto aparece sob um determinado aspecto, nos tempos modernos, ela atende pelo nome de mercado, se abrigando sob o manto e a pseudo-autoridade do neoliberalismo. E ao modelo, a crítica é inconveniente por motivo até simples: pois esta faz parte do próprio processo da razão, admití-la significaria reconhecer que ela traz, em si, a essência crítica à irracionalidade da mundialização financeira.

    Este posicionamento, de se pretender imune às críticas como uma verdade acabada, não é próprio só de nossa época. Sociedades anteriores sempre se construíram sobre um instável e frágil equilíbrio entre o conhecimento crítico e racional, de um lado, e a irracionalidade espontânea das atividades mercantis, de outro. E, invariavelmente, a partir da ruptura deste equilíbrio, do ponto de vista histórico, instauram-se determinadas lógicas. Destrói-se a vocação universalista da capacidade crítica em troca de um relativismo estreito, incapaz de sustentar qualquer noção de universalização da verdade que, por conseqüência, se torna desprovida de ética em sociedade.

    Atualmente, um dos pratos da balança, o das determinações do mercado e da financeirização das relações em sociedade, pesará mais, em detrimento daquele da razão e da solidariedade. Mas a blindagem da isenção às críticas não foi suficiente para alcançar seu desejo estratégico e ser visto como um modelo realizador das aspirações humanas e concretizador dos ideais da sociedade. Mas "tudo que é sólido desmancha no ar" ou também quem se pretenda.

    Portanto, o momento em que vivemos evidencia fortes sinais de que pode estar encerrando-se um período.

    Conhecido como o da mais absoluta intolerância àquele aspecto de rebeldia e inconformismo, diante de realidades que se pretendiam serem indiscutíveis e intocáveis. Poderemos estar recapturando, pois, o caráter crítico do pensamento e da elaboração, permitindo dar vazão às formas e conteúdos que contrariam o espírito do nosso tempo.

    Buscando superar esta espécie de escambo que a humanidade já produziu, e sem controle poderá seguir reproduzindo, apontando para um futuro mais universalista, que não se determine exclusivamente pelo econômico mas, sim, por opor-se à multiplicação do fundamentalismo do caminho único e da irracionalidade da financeirização, capaz de instituir a razão, o humanismo e a solidariedade como moedas fundamentais de trocas do gênero humano.

    * Professor, engenheiro e deputado estadual

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/do-capitalismo-neoliberal-ao-capitalismo-de-estado/409543

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